sábado, 6 de março de 2010


Tenho saudades tuas pai. Muitas, muitas. Cada vez mais. És sempre uma tristeza imensa dentro de mim. Gostava que fosse apenas no coração. Mas não é. Estás na minha cabeça, nas minhas veias, nos meus pensamentos, no ar que eu respiro. Não choro a tua perda. Choro ainda todo o teu sofrimento. Tudo o que não te consegui esconder. Todo o buraco negro por que dei a vida para que nunca desconfiasses. E ainda assim a dúvida mata-me por dentro. Todos os dias, em todos os pormenores tu estás lá. Sempre lá. Vivo mais intensamente contigo agora que morreste do que vivia quando estavas ao alcance de uma palavra ou de um gesto. Não é a tua morte que me mata todos os dias. Foi o teu sofrimento, que nos matou aos dois e que nenhum de nós merecia, que ainda hoje me persegue. As noites em que esperei por notícias tuas num corredor de hospital. Em que senti o meu outro eu, que eras tu, desfazer-se diante dos meus olhos sem que eu te pudesse acalmar a dor. Morri na tarde em que me disseram que ias morrer. Morri porque não te queria perder. Morri porque tive de te olhar nos olhos e ir-me despedindo aos bocadinhos sem que tu te apercebesses. Hoje sinto o silêncio da tua ausência. Está entre mim e o resto do mundo. Isola-me. Já não choro quando oiço falar de ti, mas ainda me escondo debaixo dos lençóis enrolada como um caracol. Não fiquei chateada porque me deixaste sozinha. Fico triste comigo mesma por não ter a felicidade de conseguir viver as alegrias que um dia mais tarde sei que te vou contar. Não tenho a quem falar de ti porque era contigo que eu falava. Tu não eras só o meu pai, eras o outro de mim. Eras e serás sempre. Mas há dias em que me dói mais. E nas últimas semanas tem doído.

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