segunda-feira, 14 de junho de 2010

sobre a miséria dos outros

Pior do que a miséria humana com a qual não nos identificamos e dos quais somos apenas meros espectadores é a outra. Aquela muito mais próxima. Aquela que nos deixa a pensar. Aquela em que confessamos em silêncio: se um dia a vida me corresse de tal forma mal que ninguém me ajudasse, também eu poderia acabar assim. Essa assusta.
Há uns dias que não me sai da cabeça. Como é que pessoas que têm, aparentemente, tudo para poderem ser felizes na vida (que já foram felizes na vida) caem ao mais baixo da miséria humana? Como se suportam? Como se apoiam? Como se puxam para baixo? Como não percebem os olhares de piedade dos que os rodeiam? Porque já caíram tão fundo que não percebem.
A A e o N são assim. Podiam ter sido tudo. E não são nada. Não lhes falta inteligência. Nem cultura. Nem simpatia. Nem sentimentos. Faltou-lhes alguém que os agarrasse à vida. Porque agora já só se agarram um ao outro nas misérias que lhes restam. E dói olhar. Dói vê-la a chorar e falar-lhe quase como se fosse a uma criança. Porque foi nisso que ela se transformou. Porque é assim que eles serão até que a vida lhes ponha um ponto final. Por muito que discutam e depois desçam a rua de mão dada nada mais há a esperar. Uma lenta contagem até ao final.
E isso fez-me olhar à minha volta. Porque quero acreditar que tenho força para nunca ser assim. E se o destino me matar de tal forma que deixe de ser quem sou, quero acreditar que tenho quem me apanhe a meio da queda. Para que os outros nunca olhem para mim com a piedade com que eu olho para eles.

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