Eu vou tentar, mas não prometo que consiga. Há feridas ainda demasiado abertas. Coincidências que me magoam como bofetadas duras. Mas vou tentar. Não perguntes porquê, mas sinto que o faço um bocadinho por ti. Sempre por ti, como foi e será. Só de olhar para a capa desato logo a chorar, mas não é isso que me incomoda. É a semelhança das palavras. Porque as ouvi antes de ti. Da tua boca. Do mais fundo do teu querer, quando já a esperança se tinha ido. A angústia do que ficou por fazer que só quem está perto do fim sabe.
A tua morte pai, mudou-me a vida e mudou-me enquanto pessoa. Talvez seja isso o menos mal de tudo: eu não seria quem sou, disposta a fazer por mim e pelos outros, se não tivesse vivido tudo os dias, durante dois anos, o teu sofrimento. Se não tivesse visto os teus olhos de súplica a veres o tempo a escorrer-te pelos dedos já sem que a vontade to deixasse agarrar. Porque não havia nada a fazer. Foi uma frase que te ouvi. Aproveita a vida. Disseste-ma numa cama de hospital, a chorar. É a ela que me agarro hoje e sempre. Mesmo quando estou mais em baixo nunca me esqueço dela. Porque esquecer-me dela, seria esquecer-me de ti. E de tudo o que nós os dois passámos juntos. De todas as horas passadas - não perdidas - no corredor daquele hospital.
Há coisas em que vamos ser sempre nós os dois. E não é por tu agora não estares que eu vou desistir. Vou continuar sempre contigo. A falar. A chorar. A rir. A partilhar. Um dia mais tarde, algures, em algum lado, hei-de te poder abraçar outra vez e rirmo-nos disso. Até lá, eu vou fazer o que tu me pediste, ou me mandaste, aproveitar a vida.
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